Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sexta-feira, 13 de maio de 2016

Breve estudo sobre o poeta Ivan Junqueira

Ivan Junqueira
Partindo da idéia de que poesia é algo muito subjetivo, logo é muito difícil dizer o que é, muitas vezes, grandemente bom ou grandemente ruim, vem-se aqui falar de um poeta brasileiro de produção poética (e também ensaística) consolidada, por já ter muitos livros publicados, além do fato de já haver falecido.

Enfim o que se pretende aqui é fazer uma súmula da produção poética deste autor, percorrendo todos os seus livros de poesia, no que se pôde ler obviamente, e tentando localizar devidamente o lugar de Ivan Junqueira dentro da poesia brasileira (e talvez, até além disso).

Comecemos pelo seu livro “Os mortos”, que segundo um crítico literário que agora foge à memória, seria um livro pronto a ser publicado, àquela época (precisamente 1964). Algo que parece ser característico da poesia de Ivan Junqueira e vai percorrendo todos os seus livros de poesia é uma amena poesia. Para ser mais claro, citem-se seus versos: “Minha mãe chorando no fundo da noite / Apunhalou o sono de Deus”. Esse poema é do seu livro “Os mortos”. O tema metafísico, divino é muito presente na     poesia de Ivan Junqueira, inclusive pelo fato da morte já ser fato presente muito cedo na sua vida (fala-se de seus parentes), muito parecido com Manuel Bandeira (poeta muito prezado pelo Ivan) aliás, (infelizmente não se tem o dado confirmado da morte precoce dos seus parentes, mas recorda-se isso de uma de suas entrevistas dadas).

Além desse livro temos o “Opus descontínuo” (1969-1975) que continua a caracterização da poesia de Ivan Junqueira, como vinha inicialmente e por excentricidade, cite-se o haicai que termina o livro: “Na gaiola jaz / o pássaro / sem espaço.”

Passa-se agora a seu terceiro livro, “Três meditações da corda lírica” (1977) que merece ter citado um trecho interessante: “de te saberes resto de um menino / que anoiteceu contigo num jardim / entre brinquedos e vogais partidas.” Volta-se à questão de se saber o que é grandemente bom ou grandemente ruim, poesia é algo muito subjetivo e às vezes o que parecia bom pode ser ruim e o que parecia ruim na verdade é bom. Está se analisando apenas o terceiro livro de Ivan Junqueira, mas, na verdade, pode se dizer, até sem temor, que isso é tona de sua poesia: uma amena poesia, que é adensada pelo leitura do texto todo. Até porque, quem escreve estas linhas, acredita que um poema só pode ser devidamente classificado como ruim ou bom, pela sua leitura inteira. É verdade que há exceções de versos isolados que podem também ser considerados como grandes versos, mas na verdade são casos específicos e se pode dizer que o Ivan Junqueira sorve dessas situações.

Segue-se o livro “A Rainha Arcaica” (1980), que, curiosamente, é um livro que foge um pouco à característica da poesia do autor carioca, que é trabalhar contradições, pode-se dizer que é um poema narrativo e biográfico e biográfico mesmo já que é feito em cima da rainha Inês de Castro.

Segue-se ao livro “A Rainha Arcaica”, o livro “Cinco movimentos” (1982), musicado por Denise Emmer, e que continua a característica do livro anterior. Para finalizar a falação sobre este livro, citem-se versos realmente emocionantes: “E te amarei porque sei perdida / e mais te amara, fosse eterna a vida.”

No livro “O Grifo” (1987) , o que se suspeitava realmente acontece, vejamos na leitura dos livros posteriores. Como o poeta Lêdo Ivo que chancelou o poeta Ivan Junqueira como um poeta que se imarcescibilizou, tendo a si mesmo, o próprio poeta alagoano como referência, Ivan Junqueira cristaliza sua poesia e a dignifica, torna-a  constante. Seus versos ainda são amenos, mas de uma amenidade grande. Como exemplo cite-se o poema “O Gato”: “Vai e vem. O passo / deixa no soalho, / menos que um traço, / um fio escasso / de ócio e borralho. // Clara é a pupila / onde não chove / e que, tranqüila, / no ermo cintila, / mas não se move // A pose é exata / a de uma esfinge / da cauda à pata, / nada o arrebata / ou mesmo o atinge. // Aguça o dente, / as unhas lima: / brinca, pressente / e, de repente, / o pulo em cima. // A voz é como / sussurro de onda; / infla-lhe o pomo, / túmido gomo / que se arredonda. // Lúdico e astuto, / eis sua sorte: / alheio a tudo, / olha sem susto / o tempo e a morte.

No livro “A sagração dos ossos” (1994), de início volte a se notabilizar aquela questão destacada no começo deste ensaio, ou seja, é sempre muito difícil falar o que é um poema grandemente bom ou grandemente ruim (apesar de que o grandemente bom provavelmente seja possível). Diz-se isso por causa de estrofe tão boa de poema homônimo ao livro de que se trata agora. Reproduza-se a estrofe: “De quem foram tais despojos / tão nulos e sem memória / tão sinistros quanto inglórios / em seu mutismo hiperbólico?” É como se vem pensando, a poesia é um risco e muitas ou poucas vezes o poeta acerta ou erra.

Uma impressão que está ficando é que de tanto ler os poemas de Ivan Junqueira, uma coisa é preciso se admitir: ele é um poeta que trabalha. E como há de se ficar indisposto com tantos versilibristas que existem por aí!... Até porque o nosso poeta carioca preza as formas fixas, seja o soneto, principalmente elisabetano ou outro, o terceto italiano também... mas por, conclusão pessoal, deve-se dizer que isto é questão de momento, pois se se tratar de uma enxurrada de bons versos livres, a sensação da querença da poesia metrificada passa e volta-se a inebriar-se por versos não-metrificados. Coisas de quem convive com a poesia...

Passe-se para o livro “O Outro Lado” (2007). É um livro que, como o próprio autor diz, reúne poemas que estão no seu livro ‘Poesia reunida” (2005) e para não falar muito destaque-se um poema filosófico: “Morrer, dormir. Dormir! Talvez, / Sonhar. Eis a dificuldade. / No sono da morte que sonhos / Virão, solto o tufão da vida, / Então cismamos: e a desgraça / Desta longa vida está feita. / Quem traria tão grandes cargas, / Gemer, suar a dura vida, / Se não temesse um além da morte — / Terra indescoberta, da qual/ Nenhum viajante retorna —, / A perder a vontade e impor / Sofrer nosso mal a lançar-nos / Noutro de que sabemos nada?”

Para terminar o estudo sobre os livros publicados do autor, fala-se de “Essa Música” (2014). Para relembrar o que foi dito antes, lembrando o poeta Lêdo Ivo, que tanto considerava o poeta Ivan Junqueira como em permanente evolução, mostre-se um poema seu que é um meta-poema chamado “O poema”: “Não sou eu que escrevo o meu poema: / ele é que se escreve e que se pensa, / como um polvo a distender-se, lento, / no fundo das águas, entre anêmonas / que nos abismos do mar despencam. // Ele é que se escreve com a pena / da memória, do amor, do tormento, / de tudo o que aos poucos se relembra: / um rosto, uma paisagem, a intensa / pulsação da luz manhã adentro. // Ela se escreve vindo do centro / de si mesmo, sempre se contendo. / É medido, estrito, minudente, / música sem clave ou instrumentos / que se escuta entre o som e o silêncio. // As palavras com que em vão ao invento / não são mais que ociosos ornamentos, / e nenhuma gala lhe acrescentam. / Seja belo ou, ao invés, horrendo, / a ele é que cabe todo engenho, // não a mim, que apenas o contemplo / como um sonho que se sustenta / sobre o nada, quando o mito e a lenda / eram as vísceras de que o poema / se servia para ir-se escrevendo.”

Consultando o site da Academia Brasileira de Letras, pôde-se se deparar com dois poemas inéditos do autor: “Dom Quixote” e “A imortalidade”. O primeiro é um poema que se poderia chamar de narrativo e o segundo ratifica uma característica do poeta Ivan, que é a de prezar as formas preclaras e aqui está se falando da terza rima. Assim conclui-se o ensaio sobre o poeta estudado.

P.S.: o autor destas linhas cometeu uma omissão, pois pretendia localizar o lugar do poeta Ivan Junqueira dentro da poesia brasileira e até além disso. Pelo contato contínuo com a sua poesia, permite-se esta conclusão, que na verdade não é de quem aqui escreve, mas sim do crítico literário Wilson Martins, que aposta na poesia do Ivan junto com a de César Leal, Gerardo Mello Mourão e Afonso Romano de Sant’anna como a poesia que vai ficar para a posteridade. Como nem tudo passava pela mão do falecido Wilson Martins, poderiam se acrescentar mais alguns nomes, mas por fazerem parte da formação de quem aqui escreve, citam-se apenas dois. Dois poetas alagoanos, um, falecido, e que já morava há muito tempo no Rio de Janeiro (trata-se do poeta Lêdo Ivo) e outro radicado em Pernambuco, trata-se do poeta Ângelo Monteiro. Foi necessário fazer este pós-escrito.  Glauber de Oliveira - Brasil

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Glauber de Oliveira. Formado no bacharelado de Ciências Sociais pela Universidade Federal de Pernambuco com a monografia “Pela Sociologia da Poesia” (2004) e também formado em Filosofia, também pela Universidade Federal de Pernambuco, com a monografia “A Poesia na ‘Poética’ de Aristóteles” (2015). Autor do ensaio “Lêdo Ivo e João Cabral: uma visão geral” publicado no jornal russo ‘Pravda” e também na revista portuguesa ‘Triplov”. Tem uma menção honrosa pela Associação Niteroiense de Escritores (2001) e outras duas menções honrosas pela Academia Pernambucana de Letras (2001 e 2003). 

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