SÃO PAULO – Quem vive o
dia-a-dia do comércio exterior sabe que, depois de 35 anos de êxitos
econômicos, a China deparou-se em 2009 com uma recessão mundial e teve de
abandonar a antiga política de exportar maciçamente produtos de baixa
qualidade, substituindo-a por outra de alto valor agregado com base em
tecnologia de ponta. Como isso exige cérebros mais desenvolvidos, o governo
chinês tem investido muito em educação para formar grandes contingentes de
mão-de-obra especializada.
Ao mesmo tempo, o novo modelo
chinês prevê o crescimento de seu mercado interno, com a formação de uma classe
média capaz de absorver grande parte de sua produção industrial. Isso exige a
expansão dos seus negócios ao redor do mundo, pois só assim lhe será possível
garantir o fornecimento de insumos para a sua indústria. Exemplo disso é o
grande número de acordos setoriais assinados recentemente com a Argentina, cujo
interesse, claro está, é usufruir no futuro de maciças exportações para o
mercado alimentício chinês que já se encontra em franca expansão.
Ainda que não haja um feroz
antagonismo entre EUA e China, sabe-se que a política externa de cada um desses
mega-países exclui o outro. Tanto que a China não faz parte do recente Tratado
Transpacífico (TTP) e, em contrapartida, lançou em 2014, dentro do âmbito do
foro Comunidade de Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac)-China, uma
iniciativa destinada a se tornar um tratado que exclui explicitamente EUA e
Canadá e prevê pesadas inversões na região.
Levando-se em conta a ideologização
que tem marcado o Mercosul, que nos últimos tempos passou a funcionar mais como
fórum de discussão política do que comercial, parece que a América do Sul
deverá se inclinar para a esfera chinesa, principalmente se a próxima rodada de
negociações com a União Europeia (UE) vier a fracassar, a exemplo de outras nos
últimos 15 anos.
Não parece esse um caminho
nebuloso, considerando-se que, segundo cálculos do Fundo Monetário
Internacional (FMI), em 2020, a economia chinesa deverá abranger um quinto do
Produto Interno Bruto (PIB) mundial. Sem contar que hoje a China já é o
principal produtor de manufaturados, desalojando das posições cimeiras EUA e
UE. Em compensação, sabe-se que a China, apesar de suas dimensões continentais,
não dispõe de grandes extensões de terra aráveis nem de recursos hídricos muito
generosos, o que significa que, por largos anos, haverá de ser um grande
importador de alimentos.
Portanto, é fundamental que os
atuais responsáveis pela política externa brasileira saibam ler com atenção as
tendências globais. Já não se está à época do alinhamento automático, o que
equivale a dizer que o Brasil não só deve procurar aderir ao TTP, apesar do
grande obstáculo que é a baixa competitividade de sua economia, como lutar por
um acordo Mercosul-UE e igualmente estar aberto para um relacionamento
comercial intenso com a China, adotando uma política extremamente pragmática,
que preveja o mútuo benefício. Afinal, há muito que se sabe que um país não tem
amigos, mas apenas interesses. Milton
Lourenço - Brasil
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Milton Lourenço é presidente
da Fiorde Logística Internacional e diretor do Sindicato dos Comissários de
Despachos, Agentes de Cargas e Logística do Estado de São Paulo (Sindicomis) e
da Associação Nacional dos Comissários de Despachos, Agentes de Cargas e
Logística (ACTC). E-mail: fiorde@fiorde.com.br. Site: www.fiorde.com.br.
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