Obrigar
os residentes a aprender português não vai resultar, por mais que o Governo
Central e as autoridades locais queiram, avisa um linguista. Gabriel Fang
acredita que a língua só vai prosperar quando os chineses de Macau perceberem
que saber falar português os ajuda a ganhar dinheiro
As políticas governamentais
devem cada vez mais ter “uma perspectiva multilinguística”, em vez de apostar
tudo numa só língua dominante, defendeu ontem Gabriel Fang, durante uma
palestra na Universidade de Macau. Mais tarde, o professor da Universidade de Shantou,
em Cantão, disse ao Ponto Final que a sobrevivência da língua portuguesa na
cidade depende muito da existência ou não de “meios de instrução em português”,
sobretudo escolas.
O primeiro Plano Quinquenal da
cidade, apresentado em Setembro de 2016, promete a definição de um número
mínimo de horas para as escolas particulares com cursos de português, além de
um aumento do número de escolas com esta disciplina e o número de turmas de
português ministradas através do ensino regular. No mês seguinte, o
primeiro-ministro chinês Li Keqiang veio a Macau pedir exactamente um reforço
do ensino da língua portuguesa.
Ainda assim, Gabriel Fang
avisa que, por muito que Pequim obrigue as autoridades locais a promover o uso
do português, “uma política linguística imposta de cima” dificilmente terá bons
resultados. Ou seja, de pouco vale obrigar a população chinesa de Macau a
aprender português como língua estrangeira.
O académico esteve em Macau
para falar da influência que o cantonense tem no inglês que é falado no Sul da
China, incluindo em Hong Kong. O inglês é hoje em dia “usado como a língua
internacional”, mas ele teme que isso “acelere o desaparecimento das línguas
minoritárias, como sejam o cantonense e o português.
Vantagem
económica
A única saída, defende Gabriel
Fang, é convencer os residentes que saber falar português vale a pena, como
meio para concretizar “os seus sonhos e esperanças”, sobretudo no que toca a
ter uma carreira profissional de sucesso. Aliás, o especialista acredita que o
sucesso da língua inglesa explica-se pela vantagem económica que oferece aos
falantes.
Também Macau tem tentado
transformar o português numa vantagem competitiva para a cidade, tomando o
papel de plataforma de serviços entre a China e os países de língua portuguesa.
O investimento de empresas chinesas em Portugal, Brasil, Angola e Moçambique
tem aumentado nos últimos anos, criando mais procura por profissionais
bilingues.
Por outro lado, o investigador
admite que haja alguma resistência por parte da população chinesa a aprender
português “por razões históricas”, que se prendem com uma herança como língua
colonial. Aliás, até 1999, a falta de conhecimento de português era uma
barreira intransponível para todos aqueles que tivessem ambições de subir na
função pública de Macau.
Gabriel Fang admite que “não é
tarefa fácil” convencer a população local, com uma língua materna já de si
ameaçada pelo peso do mandarim na China continental, a virar agulhas para o
português. Um método possível, diz ele, é “promover o conhecimento da língua”,
de forma a que não seja um tamanho bicho-de-sete-cabeças para os falantes de
cantonense.
Ainda assim, o académico não
tem dúvidas que a língua portuguesa “faz parte da identidade” da cidade. Ele
aponta como exemplo mais claro os azulejos de estilo português com os nomes das
ruas de Macau, muitos dos quais são originalmente em português e cuja pronúncia
foi simplesmente traduzida para cantonense. Vítor Quintã – Macau in “Ponto Final”
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