A
China tem investido cada vez mais no ensino da língua portuguesa, nomeadamente
devido às relações comerciais com vários países lusófonos. No entanto, as
oportunidades de certificação profissional necessária a quem pretende exercer
as funções de tradutor ou outras semelhantes não acompanham a crescente
procura. A conclusão é de Ye Xinlei que na sua tese de mestrado na Faculdade de
Letras da Universidade de Lisboa aponta ainda vários motivos para as actuais
circunstâncias. A RAEM surge como ponto determinante para fazer face a estes
problemas
O desenvolvimento da
certificação de Português Língua Estrangeira (PLE) “não acompanha o ritmo da
expansão do seu ensino e aprendizagem”. A ideia é defendida por Ye Xinlei, na
sua tese de mestrado “O Português na China: alguns aspectos do seu
ensino-aprendizagem e avaliação”, pela Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa.
A tese destaca que esta
situação tem vários motivos, entre eles “a imperfeição do sistema de ensino da
Língua Portuguesa”. “Sendo uma língua estrangeira pouco utilizada emergente na
China, o sistema de ensino de PLE está na fase de exploração e melhoramento,
enfrentando vários desafios”, refere.
O primeiro problema apontado
prende-se com a qualidade dos docentes. “O nível dos docentes influencia
directamente a aprendizagem dos alunos. Actualmente há uma escassez de docentes
doutorados na área da Língua Portuguesa, como tal, a procura de docentes
qualificados torna-se uma tarefa difícil”, frisa Ye Xinlei.
Por outro lado, “os meios
académicos internos constituem elementos cruciais para o desenvolvimento dos cursos
oferecidos”. “Nos últimos anos, tem sido dada uma crescente valorização a estes
dois aspectos, enquanto a avaliação e a certificação de PLE tem sido menos
valorizada”.
Ao mesmo tempo, há uma
diferença entre a oferta e a procura. “As enormes potencialidades de troca bilateral
entre a China e os países de Língua Portuguesa exigem uma grande quantidade de
mão-de-obra, designadamente pessoal qualificado em português para preencher as
vagas no mercado lusófono”. “Porém, continua a existir carência de pessoas
especializadas neste mercado”. Assim, refere Ye Xinlei, formar e oferecer quadros
qualificados “tornam-se uma prioridade”.
Além disso, é referida “a
situação embaraçosa em que se vêem alguns dos graduados em português”. “Por vezes,
as suas competências estão longe de ser capazes de satisfazer os requisitos
cada vez mais exigentes de uma sociedade plural”. “O que a sociedade procura
são pessoas versáteis, que se conseguem adaptar rapidamente a diferentes
circunstâncias de trabalho e tratar calmamente de assuntos vários”.
Uma das preocupações prende-se
com o facto de, nos cursos de licenciatura, não se apostar no estudo de
aspectos técnicos e de áreas profissionais específicas, “pelo que os graduados
nem sempre dispõem de capacidades de resolução de problemas técnicos”. “Esta
situação tem levado a que muitas empresas mandem os funcionários técnicos
internos estudar Língua Portuguesa, em vez de recrutar graduados em Português,
por isso, um certificado de conhecimentos linguísticos não é visto como
essencial neste contexto e, consequentemente, a certificação não é tão
valorizada como podia ser”.
“Perante o elevado número de instituições
que fornecem cursos de língua portuguesa, a escassez de instituições que
aplicam exames de certificação de PLE internacionalmente válidos reflecte uma
desvalorização do reconhecimento das competências linguísticas, fazendo com que
o sistema do ensino e aprendizagem de PLE na China perca equilíbrio académico”,
refere o texto.
Para abrandar este fenómeno, considera
que é preciso levar a cabo investigação em termos dos graus de dificuldade da
LP para aprendentes chineses, “formular critérios rigorosos de avaliação e selecionar
lugares apropriados para os exames, o que exige um longo caminho a percorrer”.
Por forma a colmatar estes
problemas, Ye Xinlei aponta um factor importante: a “crescente influência e reputação
internacional da RAEM promove de forma positiva o estatuto internacional da China
e a vontade dos estrangeiros” de conhecer o país. “Reciprocamente, a China Interior
esforça-se para desenvolver um intercâmbio dinâmico com este território e
intensificar uma relação de proximidade”, frisa.
Na sua perspectiva, “os
contactos da China Interior com a RAEM estão inevitavelmente relacionados
também com a Língua Portuguesa, em especial, com o papel que as instituições de
Macau têm assumido no desenvolvimento do ensino e na formação de professores de
Língua Portuguesa”.
Alunos
são adultos
Tendo em conta que o Português
não possui a influência da língua inglesa na China, o ensino e aprendizagem de
PLE na China têm como público maioritariamente os adultos. “Com a crescente
procura de quadros especializados em Língua Portuguesa para o mercado laboral e
as relações externas, surgiram cada vez mais universidades e instituições que
oferecem cursos de Língua Portuguesa, contudo, devido à falta de experiência de
ensino e de professores qualificados, o ensino de PLE tem enfrentado vários
desafios”, adverte.
Ye Xinlei sublinha que, para
superar as dificuldades e manter a dinâmica de aprendizagem da língua, “as
instituições desenvolveram uma série de planos como intercâmbio académico,
bolsas de estudo e debates interuniversitários”. Não obstante o progresso do
ensino e aprendizagem da língua, a certificação demonstra “um contraste
acentuado”. “A característica mais óbvia é a reduzida existência de
instituições que oferecem a certificação de PLE”.
“Hoje em dia, possuir uma
certificação é uma vantagem absoluta no ambiente de competição intensa. Ter um
certificado de Língua Estrangeira significa obter mais opções de trabalho e
oportunidades de promoção”.
Em jeito de conclusão, Ye
Xinlei defende que o ensino/aprendizagem e a avaliação/certificação constituem,
em conjunto, o sistema de ensino de uma língua estrangeira. “Embora sejam
partes independentes e tenham a sua própria metodologia, complementam-se no
processo de aperfeiçoamento. O progresso de qualquer um não pode ser obtido em
detrimento de outro”.
Nesse sentido, “o que a
sociedade chinesa deve fazer hoje é garantir a qualidade dos docentes”, isto é,
“ter uma exigência rigorosa em relação aos seus diplomas e qualificações, definir
cursos adequados, oferecer recursos extracurriculares como actividades de
visita à Embaixada ou Consulado de Portugal, do Brasil ou de Angola, se for
possível, debates em português com outras Universidades, criar mais postos de
certificação de PLE e desenvolver a investigação neste campo”.
Até ao momento foram criadas
17 delegações do Instituto Confúcio no mundo lusófono. Em contrapartida, existem
mais de 20 universidades que oferecem cursos de Português na China. De qualquer
modo, sustenta Ye Xinlei “o progresso do ensino e aprendizagem e da formação do
PLE na China é indissociável das relações políticas, económicas e comerciais
que se tornam cada vez mais estreitas entre a China e os países de Língua
Portuguesa”. Inês Almeida – Macau in “Jornal
Tribuna de Macau”
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