A
Revolução 4.0 promete eficiência, redução de custos e preservação ambiental,
porém o preço para a mão de obra é alto
“Estaremos cada vez mais em
contato com siglas como IoT, M2M, IPV6, Wireless, virtualização, nuvem, Big
Data e RFID e devemos começar a nos acostumar”, afirma o professor e mestre em
Gestão Empresarial da Fundação Getúlio Vargas, Rubens Kiso, do grupo
FocusNetworks.
A primeira revolução
industrial histórica, impulsionada pela implantação das máquinas de tear na
Inglaterra, aconteceu no século XIX. Em seguida, a economia mundial sofreu
mudanças estruturais geradas pela industrialização idealizada no início do
século XX por Henry Ford, nos Estados Unidos. A terceira revolução aconteceu
com a automação dos processos, em 1969, e hoje vivemos uma quarta fase,
tecnicamente batizada de 4.0, que teve início na Alemanha, em 2010.
Rubens Kiso apresentou sua
palestra no II Workshop de Gestão Empresarial “O Papel do RH na Crise”,
realizado na Pousada do Quilombo, em São Bento do Sapucaí – SP, com a presença
de 60 profissionais da área de recursos humanos representando multinacionais
estabelecidas na região do Vale do Paraíba.
“Com a migração dos processos
industriais para o universo cibertnético, o que veremos a partir de agora será
uma interação muito mais completa entre o homem e a máquina, que vai mudar a
forma de atendermos às demandas industriais”, explicou o especialista. Entre os
benefícios da nova era, ele enumerou a redução de custos, a conservação
ambiental, a economia da energia, com o fim do desperdício, a redução de erros
e a personalização de produtos e serviços em uma escala sem precedentes.
Por meio do conceito IoT
(Internet das coisas, na sigla em inglês de Internet of Things), tudo estará
conectado, desde os ambientes privados até os comerciais ou industriais,
passando pelo setor de logística, distribuição e transportes. Rubens Kiso
aponta para uma inversão na ordem da oferta e demanda: “na prática, estamos
falando de interoperabilidade, virtualização e orientação a serviços: hoje em
dia, já não é mais a indústria que desenvolve produtos para o consumidor
comprar, mas sim o consumidor é que demanda a produção para a indústria suprir”.
De acordo com estatísticas
da McKinsey, a Revolução 4.0 deve reduzir o consumo de energia em 20% e os
custos com mão de obra em 25%, aumentando a produtividade em 30%, não apenas
com a conexão entre homens e máquinas – e máquinas com máquinas – mas também
com a robotização dos processos. Espera-se que os robôs consigam reduzir os
custos operacionais das empresas em 5%, com impacto econômico global da ordem
de US$ 2,3 bilhões.
A
tecnologia não “pode” ocupar, ela “vai” ocupar o ambiente industrial
Rubens Kiso reconhece que o
viés negativo da revolução, obviamente, são as condições de empregabilidade:
“mundialmente, 60 milhões de postos serão substituídos na indústria, algo que
pode ser catastrófico, no entanto pode ser extremamente necessário, uma vez que
a população global vem envelhecendo a passos largos, especialmente na Europa,
mas também nos países em desenvolvimento”. No Brasil a expectativa de vida já
aumentou recentemente de 72 para 75 anos, o que nos leva a esperar que logo vá
faltar mão de obra.
Até 2001, existiam 756 mil
robôs no mundo, principalmente (e quase exclusivamente) concentrados no Japão e
na Alemanha. Em 2013, com a quantidade mundial de robôs ultrapassando os
milhões, o Brasil possuía apenas 16 mil unidades, 80% das quais inseridas na indústria
automobilística (a fábrica da Nissan, no Brasil, hoje tem 70% da linha de
produção totalmente robotizada). Hoje, a população mundial de robôs cresce 74%
por ano (em 1980 eram 45% ao ano).
Mercado
consumidor x mão de obra disponível
Algumas décadas atrás, a
Europa apostou em um processo de desindustrialização, passando a produção
física de insumos para países cuja mão de obra era mais barata, como a China.
Hoje, porém, a China também passa por uma mudança estrutural, numa iniciativa
de criar mercado interno e desenvolver, junto com a Índia, um mercado
autossuficiente. Com isso, a Europa – assim como países que seguiram a mesma
tendência de terceirização da indústria – foi levada a retomar as suas
indústrias. Com uma população economicamente insuficiente para assumir a
produção, a robotização no continente europeu foi extremamente necessária.
No Brasil, estamos bastante
atrasados com relação à robotização, embora haja incentivos vindo da própria
Alemanha para modernização, treinamento e, em alguns casos, injeção de capital.
Dos 133 países considerados “relevantes”, estamos em 121º em tecnologia, um dos
mais atrasados no planeta. Kiso lamenta que tenhamos deixado de investir em
pesquisas, o que gerou grande sofrimento às indústrias, que tiveram sua competitividade
ameaçada pela falta de mão de obra especializada: “Na gestão de Lula, o governo
afirmava que o Brasil seria ‘um grande celeiro do mundo’, o que não aconteceu o
que não aconteceu: desenvolvemos a área agrícola, na qual não se consegue gerar
mão de obra, tiraram os incentivos das indústrias e, sobretudo, os de
pesquisa”.
Como resultado, Kiso aponta
que as nossas industrias sucatearam: “não produzimos mais quase nada, todo o
nosso lucro, desde o nosso pãozinho, que leva trigo importado, é levado para
fora do país”, diz, referindo-se às multinacionais que contratam no Brasil,
pagam seus impostos, porém enviam os lucros para as suas matrizes.
O
reflexo sobre a mão de obra
“A mão de obra humana é a
parte mais cara de toda empresa. Ao trocarmos essa mão de obra, substituindo-a
por robôs, teremos um quadro que trabalha 24 horas por dia sem greve, sem
sindicato ou processos – e as indústrias estão prestando atenção a isso”, alerta
o especialista.
Para onde vão os empregos?
Ao aumentar a sua produção sem gerar novos empregos, o novo cenário certamente
deve prejudicar os países em desenvolvimento. Com essa preocupação, Rubens Kiso
afirma que devemos mergulhar em uma área da inteligência, com a necessidade de
desenvolver não apenas a tecnologia, mas também as pesquisas e a educação
especializada, da qual a primeira depende intrinsecamente.
Temos uma geração
extremamente imediatista, os recursos naturais em colapso e alterações climáticas,
e a Revolução 4.0 pode ser vista não apenas como uma ameaça aos empregos, mas
um alerta para alterarmos a forma como enxergaremos o mercado de trabalho daqui
por diante. “Há uma quantidade imensurável de postos de trabalho sendo gerados
no campo da tecnologia que os profissionais disponíveis não conseguem ocupar
por falta de capacitação”, conclui.
Previsões
para um futuro breve
Rubens Kiso enxerga para um
futuro próximo o avanço da robótica, o transporte autônomo, a inteligência
artificial e a intensificação do aprendizado para manutenção em robótica, com o
uso de materiais avançados, biotecnologia e genômica – robôs injetados no corpo
humano para cura de doenças.
Claro que há preocupações
quanto à privacidade, ética – o quanto as esferas públicas adquirem
conhecimento sobre as atividades privadas do ser humano. Além da preocupação
primordial, que será a crise dos empregos: espera-se que 4.759.000 cargos sejam
perdidos na próxima década em escritórios administrativos. Porém a notícia pode
não ser tão catastrófica assim.
Para a próxima geração,
espera-se que os profissionais busquem empregos flexíveis, tecnologias
disponíveis, uma vasta gama benéficos, em vez de grandes salários, cultura de
utilização de equipamentos pessoais “bring your own device”, uso de
dispositivos móveis, colaboração, telepresença, trabalho remoto, sistema de
home office, IoT, plataformas virtuais para reunir pessoas, processos, dados e
coisas, além de colaboradores que acessam a rede corporativa por meio de seus
próprios computadores – e de qualquer lugar. Com grande velocidade de
implementação e aceitação de novas tecnologias, as empresas poderão contratar
profissionais de qualquer lugar do mundo, criando assim uma nova rede de
talentos sem fronteiras.
Entre as qualificações
desses novos profissionais, estarão: resolução de problemas, pensamento
crítico, criatividade, gestão de pessoas, coordenação de equipes, inteligência
emocional, tomada de decisão e julgamento, orientação de serviço, negociação e
flexibilidade cognitiva. E esta era já começou. Estamos preparados? Cleci Leão – Brasil in “Guia
Marítimo”
Sem comentários:
Enviar um comentário