Rajoy e Obiang
O encontro, ou melhor, o
desencontro entre os líderes da Espanha, o presidente do governo Mariano Rajoy
com o presidente da República da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema, durante
a recente Cimeira África - União Europeia realizada em Bruxelas, são um ponto
para refletir sobre a política externa espanhola e a necessidade de a
reorientar para a retomada do diálogo com a cultura latino-americano no mundo.
Uma coisa foi certa: enquanto Rajoy desprezava a foto no seu encontro com o seu
homólogo africano, muitos outros presidentes tentaram sentar-se à mesa de
Obiang e ocupar o espaço deixado pela Espanha nas suas relações com a Guiné
Equatorial. A presença americana ou chinesa ocupam agora um espaço primordial
no país africano.
A recente Cimeira África -
União Europeia que decorreu em Bruxelas e que reuniu os ministros dos Negócios
Estrangeiros europeus e africanos para abordar os problemas Norte-Sul, tem
atraído a atenção incomum em torno dos líderes e das propostas. O
primeiro-ministro espanhol, o conservador Mariano Rajoy, conseguiu que a sua
proposta de agenda para resolver o problema da imigração ilegal que assedia
quase diariamente a fronteira espanhola nos enclaves africanos de Ceuta e
Melilla fossem incluídas, mas não se chegou a qualquer decisão para resolver este
problema que cerca as fronteiras da UE por terra e mar.
Mas o que tem atraído mais
atenção tem sido a resistência de Mariano Rajoy para deixar-se ser fotografado
com Teodoro Obiang Nguema, presidente da Guiné Equatorial, uma antiga colónia
espanhola que teve a sorte de encontrar grandes depósitos de petróleo e gás no
subsolo da plataforma continental das suas águas territoriais. Obiang aproveitou
a sua viagem à Europa e pode também tomar parte no funeral pelo falecimento do
ex-presidente espanhol Adolfo Suarez, impulsionador da transição espanhola após
a morte de Franco, em 1975, mas Rajoy e os ministros espanhóis evitaram o
contato com o presidente da Guiné Equatorial para não "sentirem-se
contaminados" nos meios da comunicação social.
Ao fim ao cabo, não deixa de
ser irónico que o mesmo Obiang Nguema nascido como espanhol em 1942, e que
inclusivamente chegou a formar-se como militar na Escola de Oficiais do
Exército que a Espanha ainda tem em Saragoça, donde saiu como Tenente. Hoje em
Espanha Obiang é tratado como um pária, mas não agem como outros países que
viram na Guiné Equatorial uma oportunidade de negócio.
O sentimento do equatoguineano
frente aos seus homólogos espanhóis é como o pai que abandonou seu filho: dor pelo
abandono e indiferença, mas o orgulho pela independência alcançada. A República
da Guiné Equatorial é hoje um país de contrastes, como pode-se observar no
decorrer do “Fórum Emerging Guiné Equatorial”, realizado em Malabo nos passados
dias 3 e 4 de Fevereiro de 2014, com uma forte representação de autoridades
financeiras e monetárias de todo o mundo, investidores internacionais e
diversas autoridades. Mas também chamou a atenção os reconhecimentos que brindam
hoje a Guiné Equatorial e o seu presidente Obiang, pelos países africanos,
especialmente do Golfo da Guiné, velhos rivais, que reconhecem na Guiné Equatorial
uma evolução, não só no económico ou nos investimentos, mas também no social e
no político.
Obiang é mais um militar que
um político, e sua orientação está sempre focada em atingir metas e objectivos
concretos. A Guiné Equatorial deixou muito rapidamente de ser considerado um
país com um baixo índice de desenvolvimento humano (IDH), para ser considerado
como médio, com um IDH de 0,55, e os especialistas acreditam que, durante os
próximos cinco anos possa atingir a categoria de alto desenvolvimento com IDH
acima de 0,70. Boa parte destes evidentes sucessos e o crescimento exponencial
que está acontecendo no país deve-se à sorte granjeada pelas suas reservas de
petróleo.
Embora neste contexto, a
situação da Espanha com respeito à Guiné Equatorial é inconcebível para muitos,
pois questiona um dos poucos líderes africanos que é neste momento respeitado
tanto pela China, os EUA ou a França. A Espanha continua em recessão nesta área
do mundo, como acontece em muitas outras, mas aqui é percebido com um
sentimento emocional que não é apreendido no resto. A Guiné Equatorial é hoje o
único país de África onde se fala espanhol, mas este idioma também está em
declínio em favor do inglês ou francês. O “Fórum Emerging Guiné Equatorial” foi
um bom exemplo: escassas foram as empresas espanholas que estiveram presentes, frente
a um aluvião de investidores e empresas francesas ou americanas: os uísques bebidos,
após o términus das sessões realizadas, nos bares e hotéis eram num diálogo em
língua inglesa.
Os pecados da Espanha com a
Guiné Equatorial vêm de há muito tempo: A Hispanoil abandonou as explorações petrolíferas
e, simultaneamente as empresas retiraram-se das explorações pesqueiras ou do
negócio do cacau. É por isso que é incrível como a Espanha e o seu governo
ignora todos os que tiveram a ver com o seu passado numa dinâmica de um salto
para a frente: enquanto Rajoy não quer sentar-se à mesa com o mandatário da
Guiné Equatorial há dezenas de dignitários de todo o mundo que estão ansiosos
para ter a oportunidade de sentar-se ao lado de Obiang e de tratar de negócios,
da mesma maneira como fazem os franceses e os americanos. Se a Espanha já foi o
primeiro parceiro económico da Guiné Equatorial, hoje esse espaço foi cedido
para o terceiro lugar para o benefício dos Estados Unidos e da China. E a
distância continua a crescer.
A Guiné Equatorial soube ganhar a pulso um crescente
reconhecimento na esfera das relações externas centro-africanas, e não tem sido
precisamente com a ajuda da Espanha. Os avanços na electrificação, água
corrente ou na habitação social são notórios, sendo um dos países da região que
mais rapidamente tem avançado nos últimos anos. É também o único que conseguiu
controlar as epidemias como a malária, ou que atingiu uma elevada cota da
escolarização infantil. A Guiné Equatorial enfrenta um futuro promissor para um
país que reúne um pouco mais de 700 mil pessoas num território relativamente
pequeno.
E a confiança que merece o
investidor estrangeiro é precisamente o da segurança que garante a presença de numerosas
empresas estrangeiras, num ambiente estável e de crescimento constante. Para
muitos dirigentes africanos, a Guiné Equatorial passou por Bruxelas como um
exemplo, um modelo invejável e a seguir por todos aqueles que quiserem
parecer-se. José Barceló – Espanha in “El
Mundo Financiero”
Tradução:
Baía da Lusofonia
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