O desenvolvimento de novos fármacos e a nanomedicina são algumas das estratégias que estão a mobilizar os cientistas da Faculdade de Ciências
Na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP), mais especificamente no Departamento de Química e Bioquímica, há duas equipas focadas em novas terapias para o tratamento da doença de Parkinson. Neste Dia Mundial da Doença de Parkinson, fomos conhecer duas abordagens diferentes, mas complementares, para dar conta da investigação da FCUP no âmbito desta doença.
A doença de Parkinson é uma doença neurodegenerativa que afeta as regiões do cérebro humano responsáveis pelo controlo dos movimentos, resultando principalmente da deterioração de neurónios dopaminérgicos. Para além de fármacos para aumentar os níveis de dopamina no cérebro, existem outras estratégias como o recurso a agonistas dopaminérgicos que visam potenciar e prolongar a ação da dopamina: os inibidores da monoamina oxidase B (MAO-B) e os inibidores da catecol-O-metiltransferase (COMT).
É precisamente sobre os inibidores COMT que o grupo de Química Biológica e Medicinal do Centro de Investigação em Química da Universidade do Porto (CIQUP-IMS), liderado pela docente da FCUP, Fernanda Borges, tem estado a trabalhar nos últimos anos, entre outras abordagens.
Em concreto, os investigadores recorreram à nanomedicina, nomeadamente através da utilização de nanopartículas poliméricas ou lipídicas como veículos para fármacos. O objetivo é fazer chegar ao seu destino e de forma mais eficiente os inibidores da COMT.
“No contexto dos inibidores da COMT atualmente aprovados para uso clínico, destacam-se três compostos com estrutura nitrocatecólica: tolcapona, entacapona e opicapona. A tolcapona é um inibidor potente, com ação a nível central e periférico, mas o seu uso clínico está limitado pelo risco de toxicidade hepática grave, sendo, ainda assim, utilizada pela sua elevada eficácia”, explicam os investigadores deste grupo.
Neste âmbito, os cientistas desenvolveram uma formulação de tolcapona encapsulada em nanopartículas poliméricas funcionalizadas com oligossacarídeos, o que resultou numa marcada redução da toxicidade hepática em modelos celulares, mantendo-se a eficácia farmacológica.
Este trabalho pioneiro, dado que esta abordagem nunca havia sido aplicada à tolcapona, foi publicado na revista ACS Applied Materials & Interfaces, com um fator de impacto de 8.5.
Estes avanços reforçam a relevância da nanotecnologia na reformulação de fármacos já existentes, com vista à melhoria do seu perfil de segurança e eficácia.
Um novo e mais seguro inibidor
O grupo também desenvolveu um novo inibidor da COMT que poderá ser usado como alternativa às opções atualmente disponíveis na prática clínica. Em colaboração com a Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP), demonstraram, em modelos celulares, que este novo inibidor poderá constituir uma alternativa mais segura à tolcapona e, contrariamente à entacapona e à opicapona, poderá exercer o seu efeito terapêutico ao nível do cérebro.
Este trabalho foi desenvolvido no âmbito do projeto “COMT4BRAIN: Development of centrally-active and safe catechol O-methyltransferase inhibitors”, financiado em 250 mil euros pelo COMPETE/ Fundação para a Ciência e Tecnologia. Os resultados obtidos com o novo inibidor da COMT foram recentemente patenteados a nível nacional e encontram-se também publicados na revista Journal of Medicinal Chemistry.
Atualmente, em dois projetos de investigação em conjunto com a FMUP, um deles financiado ao abrigo do programa BIP Proof, estão a desenvolver ensaios pré-clínicos mais robustos em modelos in vitro e in vivo, para avaliar outros efeitos benéficos do novo inibidor da COMT para minimizar (ou até mesmo prevenir) a neurodegeneração na doença de Parkinson.
A equipa do Grupo de Química Biológica e Medicinal do CIQUP-IMS envolvida neste trabalho integra ainda os investigadores Carlos Fernandes, Daniel Chavarria, Sofia Benfeito e Carla Lima.
Novo fármaco para o tratamento do Parkinson em desenvolvimento
Os fármacos existentes no mercado têm como objetivo aumentar a produção de dopamina no sistema nervoso central. No entanto, ao longo dos anos, estes medicamentos perdem eficácia, havendo necessidade de administrar doses mais elevadas, o que resulta em efeitos secundários que, em muitos casos, podem até exacerbar os sintomas da doença.
Uma equipa de cientistas do Laboratório Associado para a Química Verde (LAQV-REQUIMTE) tem estado a avançar com um novo fármaco para o tratamento da doença de Parkinson, mais eficiente e com menos efeitos secundários do que os atualmente usados.
“O que acontece na doença de Parkinson é que os baixos níveis de dopamina não são suficientes para ativar os recetores de forma adequada e, por conseguinte, comprometem a ativação dos circuitos dopaminérgicos. O que nós pretendemos é aumentar a afinidade destes recetores para a dopamina e, assim, conseguir que os sintomas motores sejam atenuados mesmo a concentrações baixas deste neurotransmissor”, salienta Ivo Dias, que lidera a equipa de investigadores do LAQV-REQUIMTE, que iniciou este trabalho com o projeto DynaPro, financiado pela FCT e que está a dar continuidade a esta investigação num novo projeto.
Com resultados promissores, a equipa já conseguiu identificar moléculas inovadoras capazes de aumentar a afinidade dos recetores de dopamina. Aliás, foram recentemente alvo de patente em Portugal e em Espanha.
Os investigadores conseguiram também já provar que estas moléculas são seguras, não apresentando toxicidade hepática ou cardíaca, e possuem capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica, alcançando o sistema nervoso central, como pretendido.
Ensaios in vivo
Com esses avanços, a investigação segue agora para ensaios in vivo, uma etapa crucial para determinar o potencial terapêutico das moléculas em modelos de Parkinson em roedores.
Esta equipa da FCUP é uma das poucas do mundo a trabalhar nesta abordagem terapêutica e é a única em Portugal a focar-se nos moduladores dos recetores de dopamina, nos quais se incluem a melanostatina.
A equipa está agora focada no projeto Pep2mer, financiado pela FCT, para complementar a investigação desenvolvida em moduladores dos recetores de dopamina como alternativa farmacológica para o tratamento da doença de Parkinson e conta com a colaboração da FF-USC e o Centro de Investigação em Química Biológica e Materiais Moleculares da Universidade de Santiago de Compostela (CiQUS).
Deste grupo da FCUP fazem parte Ivo Dias e José Enrique Borges, professores na FCUP e investigadores integrados do LAQV-REQUIMTE, e os investigadores do LAQV-REQUIMTE, Sara Reis, Hugo Almeida, Beatriz Lima e Xavier Correia, estudantes de doutoramento em Química Sustentável da FCUP. Universidade do Porto - Portugal
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