Pequim restabeleceu na passada
segunda-feira, 26 de Dezembro de 2016, relações diplomáticas com São Tomé e
Príncipe, após este país ter cortado os laços com Taiwan, reconhecendo o princípio
de “Uma Só China”. Num comunicado de oito parágrafos, o Governo de São Tomé e
Príncipe referiu a “conjuntura internacional e a sua perspectiva de evolução,
tendo em conta a agenda de transformação do país e os objectivos de desenvolvimento
do milénio” como motivos para a ruptura com Taiwan.
O Executivo do
Primeiro-ministro Patrice Trovoada sublinhou, por outro lado, que a evolução da
conjuntura interna e a política do seu Governo “impõem a defesa dos interesses
genuínos de São Tomé e Príncipe e do seu povo”, apesar de “não abdicar dos
valores cardinais da sua política externa e o reforço da sua adesão ao princípio
da não-ingerência nos assuntos internos de outros Estados”.
“As tensões prevalecentes no
plano internacional, a multipolarização dos centros de decisão, bem como a
defesa cada vez mais aguerrida dos interesses nacionalistas por parte dos
principais actores da cena internacional em detrimento do multilateralismo,
opção de longe mais favorável à expressão dos pequenos Estados” foram também
sublinhadas pelo Governo são-tomense.
O Governo chinês considerou
“natural” a decisão de São Tomé e Príncipe de cortar relações diplomáticas com
Taiwan e reconhecer a República Popular da China. “É natural. Quando se
reconhece e decide finalmente que é a altura de fazer a escolha certa, esse é o
momento” disse a porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, Hua Chunying.
“A China agradece e dá as boas vindas ao regresso de São Tomé e Príncipe ao lado
certo do princípio ‘Uma só China’”, disse a mesma responsável.
Já o ministro dos Negócios
Estrangeiros de São Tomé e Príncipe, Urbino Botelho, afirmou que o seu país
quer “redimir-se de erros do passado”. Além disso, disse esperar mais investimentos
chineses e que mais turistas da China invistam no seu país.
O chefe da diplomacia chinesa,
Wang Yi, defendeu que o restabelecimento das relações “trará benefícios para os
dois países” e que ambos “realizarão intercâmbios nos sectores do turismo,
media e outros”.
Aos olhos de alguns analistas
de Macau, esta mudança é natural. “Esta reaproximação era previsível, uma vez
que o objectivo das autoridades de São Tomé e Príncipe é, obviamente, conseguir
os apoios necessários para desenvolver o país”, frisou José Luís Sales Marques
em declarações ao Jornal Tribuna de Macau. “Sabemos das dificuldades que São
Tomé e Príncipe tem. É um país que precisa de ajuda externa, de investimento
estrangeiro e, embora a China não tivesse relações diplomáticas com o país, tem
lá investimentos”.
Nesse sentido, reforça Sales
Marques, a reaproximação surge na sequência de “circunstâncias que apontam para
uma presença relativamente importante da China, do ponto de vista comercial em
São Tomé e Príncipe”. “As relações entre os Estados não são as relações entre
pessoas, o que quer dizer que são baseadas sobretudo em interesses comuns e
compatíveis”, acrescentou o presidente do Instituto de Estudos Europeus, ressalvando
que a União Europeia tende a ter um entendimento diferente.
“Há um conjunto de
circunstâncias económicas, não só comerciais” a ter em conta, refere Sales
Marques, apontando que São Tomé e Príncipe “está muito na cauda do que se podem
chamar os índices de desenvolvimento, por isso, precisa de crescer e que a sua
economia se diversifique, se calhar, já que recentemente vi num documentário que
90% das receitas das exportações provêm do caju”.
Por seu turno, Arnaldo
Gonçalves defende que a reaproximação resulta de “uma reavaliação que os países
fazem em relação ao seu alinhamento internacional”. Tendo em conta que era o
último país africano de língua portuguesa que não reconhecia a China, São Tomé
e Príncipe “perdia alguma interface em termos das políticas da organização”,
salientou o professor de Ciência Política e Relações Internacionais.
Assim, considera, esta é
apenas uma “avaliação de oportunidades diferentes e que resultou noutro tipo de
alinhamento”. São Tomé e Príncipe depende de “investimento externo” e “se
calhar há oportunidades para investimento chinês”. “Desde que politicamente não
vá condenar Taiwan em termos das suas opções internacionais, acho que não há
nenhuma razão para ser criticável”, sublinhou Arnaldo Gonçalves.
Já Rita Santos vê com bons
olhos a decisão de São Tomé e Príncipe de respeitar o princípio “uma única
China” já que “é bom haver um respeito mútuo entre os países que poderá
contribuir para outros desenvolvimentos no âmbito da amizade, da cultura e da
economia”. A antiga secretária-geral adjunta do Fórum Macau destaca também como
ponto positivo o facto de haver “novas oportunidades de desenvolvimento”, o que
é benéfico para os empresários da RAEM.
“Família
completa” no Fórum Macau
Perante esta reaproximação do
Estado africano à China, Rita Santos considera que “não seria correcto” se o
país não passasse a integrar o Fórum Macau. “Para completar o conjunto dos
nossos irmãos dos países de língua portuguesa faltava só São Tomé e Príncipe.
Agora temos uma família completa”, frisou em declarações ao Jornal Tribuna de Macau
“Tenho a certeza que
rapidamente São Tomé e Príncipe vai fazer parte do Secretariado Permanente do
Fórum Macau, o que é bom, porque temos na RAEM um grupo de pessoas que ajuda a
estreitar ainda mais as relações económicas, comerciais e, principalmente,
culturais entre São Tomé e Príncipe, Macau, e a China”, defendeu Rita Santos.
Actualmente é preciso ver como
a RAEM pode funcionar enquanto plataforma, com o objectivo de “mostrar na China
a cultura” do país africano. “Também temos jovens de São Tomé e Príncipe a
estudar em Macau que podem contribuir para estreitar cada vez mais os laços de
amizade e de cooperação económica e cultural”, indicou a antiga
secretária-geral adjunta do Fórum Macau.
José Luís Sales Marques também
acredita que a relação diplomática entre a China e o Estado africano “é uma boa
notícia” para o Fórum Macau que, por outro lado, “proporciona um excelente
enquadramento a São Tomé e Príncipe”. “É uma grande oportunidade”, defendeu,
acrescentando que o Fórum “fornece oportunidades de investimento, de formação,
de relações entre pessoas, de que São Tomé e Príncipe pode beneficiar se puder
participar”.
Apesar disso, o presidente do
Instituto de Estudos Europeus ressalva que, mesmo sem a integração no Fórum
Macau, tem havido “alguma abertura”, uma vez que São Tomé e Príncipe já foi
convidado “para assistir à cimeira do Fórum em algumas ocasiões”.
Por sua vez, Arnaldo Gonçalves
desvaloriza o impacto desta decisão no eventual ingresso do país no Fórum
Macau. “São Tomé e Príncipe estava numa posição de quase entrada, mas não me
parece que haja um reforço do Fórum pelo facto de entrar. O Fórum é uma
plataforma de contacto e diálogo da China com vários países, mais nada. Ele
[Fórum] não faz negócios, só facilita contactos”. Inês Almeida – Macau in “Jornal Tribuna de Macau” com Lusa
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