Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Internacional - Privilegiando o elo social

O ecologista francês Hervé Kempf em L'Économie à l'épreuve de l'écologie, apontou a necessidade de privilegiarmos o elo social, ao invés da satisfação individual, muito identificada com o consumismo.

Para tanto, urge “renovar a economia”, substituindo a obsessão material que é alimentada pelo crescimento físico (mais produtos e serviços) das economias, robustecendo assim o mercado de consumo.

Num outro livro muito interessante, Pour sauver la planète, sortez du capitalisme, Hervé Kempf, em relação a esse mesmo assunto, é ainda mais incisivo ao estabelecer os laços estreitos entre a rápida destruição do planeta com o funcionamento do sistema capitalista em todas as suas dimensões, incluindo a cultural.

Usando as palavras originais de Kempf, com livre tradução no fim deste artigo, temos que (...) un autre monde est possible, il est indispensable, il est à notre portée. Le capitalisme, après un règne de deux cents ans, s’est métamorphosé en entrant dans une phase mortifère: il génère tout à la fois une crise économique majeure et une crise écologique d'ampleur historique. Pour sauver la planète, il faut sortir du capitalisme, en reconstruisant une société où l'économie n'est pas reine mais outil, où la coopération l'emporte sur la compétition, où le bien commun prévaut sur le profit (1).

A deterioração do meio ambiente, o esgotamento de alguns dos principais serviços ecossistêmicos, a depleção dos recursos naturais para “abastecer” uma economia de mercado cada vez mais exigente em matéria de produção econômica e, em especial, as extinções da fauna e flora, fruto de ação antrópica, alcançaram ritmo jamais visto no último século.

Essa é a razão que levou o Nobel de química, Paul Crutzen, a declarar que desde o final do século XVIII “entramos” no período “antropoceno”, ou seja, na era em que predomina a influência humana sobre a biodiversidade.

Com urgência, face a situação de deterioração que os humanos têm deixado o meio ambiente, clama-se pela necessidade de reconstruir a maneira como a atividade econômica tem atuado em relação ao meio natural.

É imprescindível, para isso, estabelecer outros valores, longe da sanha consumista patrocinada, em larga medida, por uma economia que somente “enxerga” valor no mercado e nos produtos e serviços produzidos, enfatizando assim a expansão do PIB.

Se o objetivo maior ainda é o de alcançar com eficiência uma política de sustentabilidade, que respeite o meio ambiente para salvaguardar as espécies de vidas existentes, é forçoso reconhecer, na seara dessa questão, que o sistema econômico deve passar pela capacidade de atingir prosperidade sem crescimento, abandonando assim a obsessão material que mencionamos acima, incrustada no subconsciente dos mais vorazes consumistas.

Uma vez reconhecendo que a pressão humana sobre o sistema ecológico tem sido expansiva e dilapidadora, progressiva e destruidora das bases do capital natural, três fatores precisam ser contornados para que essa “reconstrução econômica” aconteça de modo satisfatório: i) controlar o aumento populacional (em 1900, a população mundial era de 1,5 bilhão de habitantes. Oitenta e cinco anos depois, o planeta atingiu 5 bilhões de pessoas e, em apenas 28 anos mais, o mundo “ganhou” mais 2 bilhões de habitantes; em 2050, teremos uma população mundial de 9,5 bilhões); ii) estancar o nível desenfreado de consumo e, iii) reduzir o uso de novas tecnologias voltadas exclusivamente ao aumento da produtividade do trabalho – base de aceleração da economia; por isso, motivo de dilapidação dos bens da natureza.

Esses fatores – em especial, os dois últimos (aumento populacional e nível de consumo) – passam, na prática, por “encaixar” a atividade econômica dentro dos limites ecológicos. Razão pela qual é de suma importância não perder de vista que a economia não pode mais “funcionar” sob o paradigma do crescimento expansivo.

Tão importante quanto isso é o fato de a economia neoclássica – fascinada pela ideia de equilíbrio e liturgicamente adepta ao dogma do crescimento econômico como paradigma supremo de prosperidade – reconhecer o que é mostrado com bastante clareza pela segunda lei da termodinâmica: que o “circuito econômico” não funciona no “vazio”, longe do meio ambiente, mas sim por dentro da biosfera. Marcus Oliveira - Brasil in “Diário da Liberdade”

Nota:

(1) Outro mundo é possível, é essencial, ele está ao nosso alcance. O capitalismo, após um reinado de duzentos anos se converteu numa fase mortal que gera tudo de uma vez; uma grande crise econômica e uma crise ecológica de proporções históricas. Para salvar o planeta, temos de sair do capitalismo reconstruindo uma sociedade onde a economia não reine, mas que seja uma ferramenta que faça prevalecer a cooperação sobre a competição, e onde o bem comum prevaleça sobre o lucro.

Marcus Eduardo de Oliveira - Economista brasileiro, professor universitário. É especialista em Política Internacional e mestre em Estudos da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP). É colaborador da Agência Zwela de Notícias (Angola) e do portal Notícias Lusófonas (Portugal). Autor dos livros "Conversando sobre Economia" e "Pensando como um economista".

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