SÃO PAULO - Quando o
País não é considerado sério, o que é insistentemente alardeado no exterior
desde os tempos do general Charles De Gaulle (1890-1970), os brasileiros
sentimos um natural desconforto e, muitas vezes, reagimos em busca de exemplos
internacionais que não deixem o Brasil tão isolado nesse quesito. Mas a verdade
é que os nossos administradores públicos estão sempre se superando, oferecendo
exemplos notórios de que aquela maledicência do antigo mandatário francês está
longe de perder a validade. Afinal, maus exemplos não faltam, só para ficarmos
na área da infraestrutura portuária.
Basta ver que, depois de
o governo federal ter investido pesado para ampliar a capacidade de portos como
Santos e Rio Grande, as áreas beneficiadas correm o risco de ficar assoreadas
novamente por falta de homologação da Marinha. Quer dizer: sem a manutenção
adequada, os portos perderam o ganho obtido com as obras de dragagem de
aprofundamento.
Por isso, a Marinha
hesita em homologar as profundidades que teriam sido alcançadas logo depois da
dragagem. No caso do Porto de Santos, depois de uma ressaca – fenômeno comum na
região –, o canal do estuário ficou assoreado e o calado foi reduzido de 13,2
metros para 12,3 metros. Já os berços de atracação variam de 11,5 metros a 14
metros.
O pior é que as obras de
dragagem, segundo a Secretaria Especial de Portos (SEP), custaram aos cofres da
União R$ 1,6 bilhão, dentro do Programa Nacional de Dragagem (PND), lançado em
2007. Esse programa previa que o governo federal assumisse a responsabilidade
pelas obras, enquanto as companhias docas ficavam responsáveis pela manutenção.
Mas hoje a própria SEP reconhece que as companhias docas não fizeram a lição de
casa.
Com isso, os portos não
podem receber navios Post Panamax, que começaram em 1998 com calado de
13 metros e hoje alcançam 15,5 metros (Post New Panamax), com capacidade
para 15 mil TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés). Sem contar o Triple
E, lançado em 2013, que também exige calado de 15,5 metros, mas tem
capacidade para 18 mil TEUs.
Outro exemplo de
malversação de recursos públicos dá-se também no Porto de Santos, onde 40
metros do primeiro trecho do novo Cais de Outeirinhos terão de ser destruídos
para a passagem do túnel submerso que ligará aquela cidade a Guarujá. Segundo a
Dersa, responsável pela ligação seca entre Santos e Guarujá, o túnel passará
por baixo da atual estrutura, mas, para tanto, será preciso retirar as estacas
que estão a 60 metros de profundidade. Um detalhe: esse trecho ainda não foi
sequer inaugurado.
A obra faz parte do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e teve seu projeto elaborado em
2011, dois anos antes da definição do traçado do túnel, que ocorreu ao final de
2013. Tudo isso mostra que não há sintonia nem planejamento entre os técnicos
federais e estaduais. E que mais dinheiro público será escoado pelos ralos.
Depois não reclamem quando algum estrangeiro diz que o Brasil não é um país
sério. Mauro Dias - Brasil
__________________________________________________________________________________________
Mauro
Lourenço Dias, engenheiro eletrônico, é vice-presidente da Fiorde Logística
Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e
Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp). E-mail: fiorde@fiorde.com.br Site: www.fiorde.com.br
Sem comentários:
Enviar um comentário