Um subproduto de deus é a certeza. Não
levamos bem que não haja nada debaixo dos pés. Talvez por isso a ciência véu a
ocupar em muitas pessoas o lugar deixado por deus. Disto não se livra, porque o
havia de fazer, a língua.
É habitual nos procelosos debates
internáuticos atacar a pouca cientificidade de uma afirmação ou apelar à
Filologia como um Salomão do século XXI a dirimir se A é B são, ou não,
entidades diferentes. Pobre filologia, invocada para resolver o que não pode.
Pobres filólogos requeridos como popes para dar a sua bênção. Bom, nem tão
pobres que alguns adoram o papel, seja dito de passagem. Deve ser difícil
renunciar ao poder das togas.
Nas últimas semanas várias músicas vêm à
minha cabeça. Parece que mudei de tema mas apenas o parece, um bocado de
paciência. Vou a caminhar e o Spotify da minha cabeça canta: “Eu sou um
rapazinho, Embora pequenino, Tenho muito tino, Sou o Ruca”. Passado um tempo a
playlist deixa sair “olá amigo, já estamos aqui, somos os caricas, vamos
brincar”. Se não bastasse, a seguir soa: “Fum ao mercado comprar café e a
formiguinha picou-me no pé”. Enfim, é o que che tem ser pai. Como? Que mudei de
tema? Não, vais ver que não.
Deixávamos atrás aos filólogos salomônicos,
com as suas togas e as suas espadas a decidir se galego e português e
brasileiro são Uno ou Trino ou Duo. Que tal se deixamos passagem aos
sociólogos, aos politólogos, aos economistas, aos programadores culturais, aos
músicos, aos encenadores e a tantos outros opinarem sobre o tema? Que tal,
ainda melhor, se perguntamos aos galegos e as galegas como vivem as sua língua?
Uns como zero, outros como uma vaga companhia, outros como o eco das aldeias,
outros como o crisol da nação galega “só para nós”, outros como uma vantagem
curricular, outros como o universo em que querem educar os seus filhos para
além dos limites que nos inculcaram, a incluir o Brasil, Angola ou Portugal. E
todos vivemos no mesmo país. Pobre Salomão. Valentim Fagim – Galiza in “Portal Galego da Língua”
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