Tenho-me impressionado com certas coisas que
venho lendo há algum tempo, sobre algo que passaram a chamar de
"estagiariocracia".
Li que estagiários são leigos, despreparados,
sem formação técnica, inexperientes, que custam ao Estado em média em torno de
um a dois salários mínimos mensais aos cofres do Estado. No fundo entendo e
compartilho, de certa forma, dessa visão. Entretanto, me revolto ao ler tais
adjetivos direcionados a nós, estagiários.
Quando estava no segundo semestre da
Faculdade de Direito da PUC-RS, ingressei como estagiário no Setor de
Processamento de Recursos do Tribunal de Justiça, setor onde permaneci por
cerca de dois meses. Ali descobri - com todo o respeito aos servidores deste
setor - que naquele local só trabalhavam os estagiários que tinham seis horas
diárias por uma bolsa-auxílio equivalente, na época algo em torno de R$ 650,00.
Insatisfeito com as funções de atender balcão
e fazer cargas de processo, solicitei a troca de local setor, e acabei chegando
à 1ª Câmara Especial Cível. Permaneci um ano e meio estagiando nesta câmara; a
experiência me fez aprender mais do que todas as cadeiras de Processo Civil da
faculdade juntas.
Durante quatro anos de estágio, inúmeras
vezes eu vi operadores do Direito já formados e investidos de cargos públicos
serem colocados em xeque, no que se refere a seus conhecimentos e técnicas, por
leigos, despreparados, sem formação técnica e inexperientes, estagiários.
Perdão se meu texto soa como ofensa a quem
serve o chapéu, mas sei o peso de estudar desde o segundo semestre da
faculdade, para depois de oito anos fazer um concurso para a magistratura.
Posso não ter anos de carreira, mas sei que domino, muito mais, certos assuntos
e questões, do que muitos advogados e juízes, que fingem conhecer algo que
deixaram de estudar quando foram empossados e passaram, desde então, a ser nada
mais do que coordenadores de equipe bem remunerados.
Pior do que ser estagiário é lidar com o ego
daqueles que não sabem medir suas palavras. A vontade que tenho é de dizer para
alguns “donos” de estagiários, simplesmente a verdade, mas ela dói. Muitos
desses senhores de estagiários, não saberiam e não conseguiriam dar um passo no
tempo certo, dentro dos tribunais, sem pedir auxílio ao seu nobre e honrado
estagiário que “paleteia” processos pra cima e pra baixo e que desenvolve uma
brilhante habilidade política ao ter de lidar com o mau humor do serviço
público.
Enfim, já trabalhei em órgãos públicos, onde
era pago apenas para levar carrinhos amontoados de processos de uma sala para
outra, ao contrário do que estava disposto nos contratos de estágio, através
dos quais, e tão somente no papel, eu era pago para aprender e pensar.
De qualquer sorte, hoje estagio em um
escritório que me dá o suporte para aprender e de fato, estagiar.
Caros senhorios, se querem se livrar da
"estagiariocracia", façam o seu papel: honrem seus salários e
vencimentos; simplesmente, trabalhem exercendo as suas funções e não as nossas.
Nós somos acadêmicos, estudamos horas e horas
para chegarmos onde vocês estão agora.
Portanto saiam de seus gabinetes e conheçam a
justiça (fisicamente) como ela realmente é; e depois, se conseguirem caminhar
sozinhos, respondam quem são os leigos. Bruno
Valério – Brasil in “Espaço Vital”
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