A
perturbação obsessivo-compulsiva é uma doença tão frequente como a asma ou a
diabetes, sendo mesmo mais prevalente que a esquizofrenia, mas a autocrítica
dos doentes faz com que haja um secretismo que a silencia
Os estudos sobre esta doença
psiquiátrica mostram atualmente que a prevalência é bastante maior do que se
pensava há poucas décadas, estimando-se que se situe entre um a dois por cento
da população geral.
António Ferreira de Macedo,
psiquiatra do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, lembra que a
perturbação obsessivo-compulsiva surge em quarto lugar em termos de prevalência
entre as doenças psiquiátricas, à frente de “doenças mais conhecidas, como a
esquizofrenia”.
O lugar da perturbação
obsessiva compulsiva tem sofrido algumas transformações, na medida em que até
há pouco tempo era considerada uma perturbação da ansiedade. Mas em 2013 a
classificação das doenças mentais sofreu uma evolução e a perturbação obsessiva
autonomizou-se.
Sendo muito prevalente é,
contudo, uma doença silenciosa e pouco conhecida, apesar de ser até retratada
em vários filmes como “Melhor é Impossível” ou “O Aviador”, como recorda o
livro “Perturbação Obsessivo-Compulsiva, o insustentável peso da dúvida”.
A obra é dirigida essencialmente
aos profissionais de saúde que lidam com questões de saúde mental e tenta
compilar os dados mais importantes da doença.
António Ferreira de Macedo, um
dos coordenadores do livro, admite que uma das razões para a doença ser
silenciosa e pouco conhecida é a perceção que o próprio doente tem da sua
patologia.
Enquanto que na esquizofrenia
(protótipo da doença mental grave) há sintomas psicóticos que determinam que a
pessoa não tem consciência de que está doente, quem sofre de perturbação obsessivo-compulsiva
tem “uma crítica muito nítida dos seus sintomas”.
Encaram os sintomas muitas
vezes como absurdos e têm vergonha da sua doença, de a comunicar e de pedir
ajuda.
“Têm receio que as pessoas os
vejam como loucos ou como pessoas perturbadas. Há esse secretismo. O que
determina que possa correr um período muito grande, de cinco ou sete anos,
entre o início dos sintomas e o pedido de ajuda”, explicou o especialista à
agência Lusa.
Caracterizada pela presença de
obsessões e/ou compulsões, a doença interfere significativamente no bem-estar e
quotidiano do doente.
As obsessões são pensamentos,
imagens ou medos de caráter recorrente e que geram grandes níveis de ansiedade,
enquanto as compulsões são comportamentos repetitivos e estereotipados, praticados
com o intuito de reduzir a ansiedade ou prevenir acontecimentos indesejados.
Podem envolver vários temas
mas tipicamente estão relacionados com a sujidade e contaminação e também com a
verificação ou contagem. A simetria e a precisão surgem igualmente como
compulsões frequentes.
“Quando uma pessoa está 10
horas por dia a tomar banho, pode inclusivamente não conseguir trabalhar. E a
compulsão da verificação também pode ser incapacitante”, refere António
Ferreira Macedo, dando o exemplo de doentes que verificam continuamente em círculo
vicioso as torneiras da água, os interruptores da luz ou os bicos do fogão.
Nos casos mais extremos, as
compulsões podem mesmo determinar uma completa incapacidade do doente.
O início da perturbação
obsessivo-compulsiva surge geralmente na adolescência ou início da idade adulta
e tem uma evolução gradual, que tende a caminhar para uma sobreposição de
sintomas.
António Ferreira de Macedo
explica que o tratamento farmacológico conjugado com psicoterapia específica é
eficaz na maior parte dos casos, havendo outros tratamentos de segunda linha
para as situações mais resistentes: a estimulação magnética e a cirurgia que
realiza uma estimulação cerebral profunda.
A obra com o subtítulo
“Insustentável peso da dúvida” pretende sublinhar um aspeto central da doença:
a carga do sofrimento que tem a ver com dúvidas e medos, o que levou alguns
autores clássicos a apelidarem a perturbação obsessivo-compulsiva como “a
loucura da dúvida”. In “Sapo24” - Portugal com
“Lusa”
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