“Ces
Messieurs Afrique, le Paris – village du continent noir” : a propósito de alegadas
declarações de um Ministro português contra o seu próprio Estado de Direito.
“Ces Messieurs Afrique” é o título de uma
obra de Stephen Smith e Antoine Glaser, que desvenda algumas relações
inconfessas, entre homens de negócios, políticos e profissionais liberais
franceses, com personalidades africanas, da África dita francófona. É desse
livro que me lembrei hoje, ao analisar os gaguejos atribuídos ao Ministro
português dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, que teria anunciado à Rádio
Nacional de Angola, que transmitira às autoridades angolanas, as desculpas do
Estado português, pelos pequenos incómodos causados, devido a certos processos
que correm nas instituições da justiça portuguesa, contra algumas e alguns
notáveis angolanos. O homem ter-se-á esquecido que em Portugal ainda vigora o regime
de separação de poderes. A menos que eu esteja desatualizado.
No caso francês, sabemos que os factos
estavam perfeitamente enquadrados dentro de uma estratégia montada, aquando da
outorga das independências àquilo que, hoje, em grande parte, são autênticas
neocolónias francesas em África. Era no cumprimento do pensamento estratégico
de De Gaulle, segundo o qual “A nossa linha de conduta é aquela que salvaguarda
os nossos interesses e que tenha em conta a realidade no terreno. E quais são
os nossos interesses? Os nossos interesses são a livre exploração do petróleo e
do gás que descobrimos e havemos de descobrir.”
Na página (web) em que encontrei aquela citação, que deste modo tentei
traduzir para o nosso português, está patente uma fotografia com um homem
branco, tendo ao lado a cabeça de um jovem preto, espetada na ponta de uma vara
pontiaguda.
É, com certeza, a propósito dessa relação da
França com a África que Agostinho Neto – homem de erros clamorosos, porque
humano do seu tempo, mas de um extraordinário idealismo – terá dito que a África
continuava como um “corpo inerte onde cada abutre” queria “debicar o seu
pedaço”.
Mas da forma como as ex-colónias portuguesas
(especialmente a Guiné-Bissau, Moçambique e Angola) conquistaram a suas
independências, estou convencidos que, entrados no mundo do pós-Guerra Fria, e
se no caso de Angola a lei da vida permitisse que Holden Roberto, Agostinho
Neto e Jonas Savimbi sobrevivessem para repararem os seus erros – porque todos
eles seres humanos – não estaríamos perante esta relação vergonhosa que se constrói
hoje, entre Angola e Portugal, que também se libertou do totalitarismo
salazarista, graças a luta do povo português, com uma liderança constituída por
figuras insignes, independentemente das ideologias, como Álvaro Cunhal, Mário
Soares e Sá Carneiro.
Portugueses e angolanos, especialmente os
mais jovens, temos que nos juntar para evitar o envenenamento da nossa relação
irmã. A nossa riqueza humana e cultural, angolanos e portugueses, é muito
superior a barris de petróleo reduzidos a “sacos azuis”.
Resistamos a transformação dos nossos países
irmãos, em meras plataformas de transação de sacos de euro-dólares, que a
ninguém levará para o céu ou libertará do fogo do inferno.
Esta mensagem também vale para o nosso
queridíssimo país irmão Brasil e sobretudo para a sua juventude. Não se juntem
a esta festa em que meia dúzia (chega a isso?) de famílias, orquestram a
desgraça sobre a maioria de angolanos de todos os quadrantes de um país, onde
tudo chegaria e chegará para todos, sem comprometer as nossas relações irmãs,
com aqueles com que vimos a escrever as páginas de uma mesma história. Marcolino Moco – Angola in “Moco Produções”
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