Soube-se no dia 30 de maio no
recinto da Feira do Livro de Lisboa de 2015. Era o dia de Olivença na dita
Feira.
Olivença! Palavra evocadora de
tantos sentimentos contraditórios! Temática de oposição demo-liberal (até
comunista!) no tempo do Estado Novo (até 1974), temática tida como salazarista
ou monárquica partir de 1974/75 (sabe-se lá porquê!), temática de sonhadores,
nacionalistas, esquerdistas. Enfim, o exemplo completo dum assunto rodeado de
preconceitos e de muita, muita ignorância.
Diziam alguns na Feira que era
um “regresso de Olivença”. Quase ninguém percebeu. Muito poucos sabem que um
dos organizadores do primeiro “ensaio” da Feira, em 1930, foi um oliventino.
Menos ainda que a primeira Feira oficial, em 1931, foi da responsabilidade
desse mesmo oliventino, Ventura Ledesma Abrantes (1883-1956). Refugiado em
Lisboa, este livreiro/editor, intelectual de reconhecido valor, foi o único
homem com coragem para editar os livros sobre sexualidade do Dr. Egas Moniz.
Conseguiu, contra vontade de Salazar, a nacionalidade portuguesa “automática”
(digamos assim) por volta de 1940. Morreu ignorado por quase todos.
No auditório da Feira do Livro
de Lisboa, naquele 30 de maio de 2015, à tarde, apresentava-se a Associação
cultural autóctone oliventina “Além Guadiana” (fundada em 2008). Com um cartaz:
“Nós falamos português há mais de sete séculos em Olivença. O bilinguismo é o
nosso futuro.”
O que se passou foi descrito
por um jornal brasileiro e presenciado por quem ali esteve. Falou primeiro
Eduardo Naharro Macias-Machado, membro da referida Associação e professor de
Português, que, entre outras coisas, disse que o futuro de Olivença deve passar
pela total integração na cultura portuguesa. “Em Olivença, temos duas línguas
maternas (espanhol e português) e queremos condições de igualdade.”Joaquín
Fuentes Becerra, o presidente da Associação, falou depois, dizendo que pelos motivos
apresentados por Eduardo “as gerações mais jovens tomaram para si a luta para
recuperar e fortalecer a língua portuguesa”, e que por isso são realizadas
anualmente atividades culturais, abrangendo a língua portuguesa (leitura
pública de textos em português), dança e música. E acrescentou: “O mais
importante desse processo é a mudança de consciência, de mentalidade. O que
identifica Olivença é o carácter bicultural.”
Já o historiador e diretor do
Museu Etnográfico, um homem com muitos trabalhos publicados, e que foi o único
que falou em castelhano, Miguel Ángel Vallecillo Teodoro apresentou livros
sobre a arquitetura de Olivença. E lembrou que a cultura oliventina teve
marcante influência também do judaísmo.
O escritor oliventino, também
membro da Associação, José Antonio Gonzalez Carrilo, mostrou Olivença através
dos livros de que é autor (e que já são muitos). Considerou Ventura Ledesma
como um dos inspiradores do seu trabalho. Disse textualmente: “Sem dúvida, este
oliventino universal, que hoje conta com uma merecida rua em Lisboa (e não em
Olivença), foi um dos grandes precursores da difusão cultural e histórica da
localidade que nesses anos começou a revelar uma injusta desvalorização.”
Finalmente, Julián Portillo
Barrios leu alguns de seus poemas, já publicados em livros, em português,
revelando que se inspirou em poetas portugueses e brasileiros. Mais, revelou
que quando estudou biblioteconomia em Buenos Aires, fez várias viagens ao
Brasil,nomeadamente a Minas Gerais, onde aperfeiçoou o seu português.
Eduardo Naharro Macias-Machado
encerrou a sessão, declamando um poema mais (este, da sua autoria). Um pouco à
margem, mas de pleno direito, o deputado português José Ribeiro e Castro, um
dos defensores da causa destes modernos oliventinos, disse esperar que o “Dia
de Olivença” se repita nos próximos anos na Feira do Livro de Lisboa.
Membros da audiência colocaram
algumas questões à Associação, e o final consistiu num breve debate.
Espera-se que este
acontecimento não caia no esquecimento e seja, pelo contrário, divulgado.
Fez-se História. Carlos Luna - Portugal
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