Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

União Europeia - Nível de vida dos portugueses é o nono pior

Estudo da Faculdade de Economia da Universidade do Porto mostra que a revisão em alta dos estrangeiros revelada em abril coloca Portugal abaixo de 80% do nível de vida da UE até 2026


O nível de vida dos portugueses face à União Europeia (UE) tem sido sobrestimado: segundo a Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP), em 2023, o rendimento “per capita” terá sido de 78,9% da média europeia (na 19.ª posição, a nona pior) e não de 80,7% (18.ª), como reportou a Comissão Europeia (CE) nas previsões de maio e se confirma nos dados mais recentes do Eurostat.

Um relatório de abril da Agência para a Integração Migrações e Asilo (AIMA) mostra uma população estrangeira com estatuto legal de residente bem maior do que nos dados oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE), contabilizando mais 250 mil pessoas nesse ano do que se supunha e, com isso, diminuindo o rendimento médio por habitante.

Admitindo como válida a informação da AIMA, a população reportada pelo INE aos organismos estatísticos europeus é inferior à real nos anos recentes, o que empola o indicador de nível de vida relativo de Portugal. Esta é a principal conclusão da análise Flash nº 3 de 2025 da FEP, que espera ver refletida a informação da AIMA nos dados do INE apenas daqui a alguns meses e, mais tarde, nos da UE.

O trabalho do Gabinete de Estudos Económicos, Empresariais e de Políticas Públicas (G3E2P) da FEP assinala que, usando pressupostos razoáveis de ajustamento da população em 2024 (com os dados disponíveis), nesse ano o nível de vida de Portugal terá sido de 79,2% da média da UE em vez de 81,6%.

Essa revisão em baixa de 2,4 pontos percentuais (p.p.) mantém-se nas previsões ajustadas da CE até 2026, ano em que o indicador se situará em 79,5%, na 21ª posição, a sétima pior, em lugar do valor oficial de 81,9% (19ª posição). O G3E2P conclui que não superámos os 80% do nível de vida da UE nos anos recentes – a última vez foi em 2010 –, quando para a CE tal sucede desde 2023.

“É preciso integrar mais rapidamente os dados da AIMA”

O estudo agora divulgado “evidencia as discrepâncias nos dados de estrangeiros e população total, que são cruciais para definir várias políticas – incluindo as de imigração, emprego, habitação e proteção social –, estimando-se que poderemos ter mais 378 mil pessoas no final de 2024 do que nos dados oficiais do INE, o que implica um nível de vida face à UE 2,4 p.p. inferior ao oficial”, afirma Óscar Afonso, diretor da FEP e coautor do estudo.

“É preciso integrar mais rapidamente os dados da AIMA nas estatísticas do INE e da UE para assegurar dados coerentes e atempados no suporte às políticas públicas”, acrescenta.

Para o diretor da FEP, ainda mais importante, “o estudo reforça a urgência da economia nacional se tornar mais competitiva: são precisas reformas estruturais para elevar o potencial de crescimento económico e preparar a redução esperada dos apoios europeus. Só assim poderemos alcançar o grupo de países com maior nível de vida da UE num horizonte aceitável e travar a emigração dos jovens portugueses”.

Novo controlo da imigração “pode reduzir crescimento económico”

Este estudo da FEP revê ainda em baixa a necessidade de entrada de imigrantes para que Portugal possa entrar, em 2033, na metade de países com maior rendimento “per capita” da atual UE. Em vez dos 138 mil imigrantes por ano (em média) calculados num estudo de 2024, só serão necessários 80 mil por ano até 2033, já considerando o número revisto atual de estrangeiros e um cenário mais realista em que a economia da UE cresce 1% ao ano, exigindo que Portugal cresça, no mínimo, 2,4% ao ano (após reformas), em média.

“A imigração deve ser regulada em função das necessidades da economia – e da capacidade de absorção da sociedade, dos serviços públicos e das infraestruturas, para integrar essas pessoas de forma digna –, o que não sucedeu nos últimos anos”, afirma Nuno Torres, responsável do G3E2P e co-autor do Flash.

O crescimento real do PIB foi 2,6% em 2023 e 1,9% em 2024, e a entrada de estrangeiros rondou os 300 mil em cada um desses anos, muito acima da nova estimativa de 80 mil se a economia crescer a um ritmo médio de 2,4%. “Um “grande desfasamento” que, para os investigadores da FEP, significa que muitos dos que entraram estarão na economia paralela, pois não pode ser explicado apenas pela inserção dominante dos imigrantes em setores com produtividade e salários abaixo da média – mas vitais à economia”.

Segundo Nuno Torres, outros dados do Flash reforçam a perspetiva de que é preciso mais controlo da imigração. No final de 2024, o número de estrangeiros com estatuto legal de residente deverá atingir 1,6 milhões, de acordo com a AIMA, correspondendo a 14,4% da população residente total revista, após 11,9% em 2023 (cerca de 1,3 milhões de pessoas) e 4,1% em 2017.

“Esta grande alteração demográfica em poucos anos confirma o descontrolo da imigração gerado pelo Regime de Manifestação de Interesse que o governo PS aprovou em 2017, por ser desligado da economia, justificando que o governo AD o tenha encerrado em 2024”, afirma Nuno Torres. “Em seu lugar, criou a ‘via verde da imigração’, que a regula pelas necessidades da economia, através do contrato de trabalho prévio – como sugeria o estudo de 2024 da FEP –, mas são precisas melhorias dada a baixa execução”. O pior, refere, é que “as medidas adicionais previstas de controlo da imigração, necessárias na sua maioria, vão longe demais em áreas em que podem reduzir o potencial de crescimento económico”.

Segundo Nuno Torres, “limitar os vistos de trabalho a estrangeiros altamente qualificadas ignora o perfil de especialização atual – que deve progredir com outro tipo de medidas –, podendo levar a falta de mão-de-obra em setores como a construção, o turismo e a agricultura, e conflitua com as restrições previstas ao regime de naturalização, ao torna-lo dos menos atrativos da UE também para os qualificados”.

“Reformas decisivas” e “uma imigração regulada pela economia”

O estudo do G3E2P assinala que as previsões da CE revistas em função dos dados da AIMA irão colocar Portugal com o sétimo pior nível de vida da UE em 2026, dois lugares abaixo do que sucede nos dados originais, e à beira de ser o sexto pior. Isto porque, neste novo cenário, Portugal só fica acima da Roménia por duas centésimas – 79,47% e 79,45% da UE, respetivamente –, quando este era um dos países mais pobres da UE ainda há poucos anos.

Óscar Afonso é perentório: “Evitar o cenário de ultrapassagem pela Roménia em nível de vida – o que parece provável e deve envergonhar o país – exige aumentar a potência do motor económico português, mas tal requer reformas estruturais que os governos têm adiado e demoram tempo a surtir efeito”.

A Roménia entrou bastante depois de Portugal na UE e recebeu menos fundos europeus, mas, segundo Óscar Afonso, “tem-nos aproveitado bem melhor, como mostra a maior tendência de crescimento económico e a forte convergência de nível de vida desde 1999, contrastando com a divergência de Portugal, pouco atenuada nos anos recentes”. O diretor da FEP sustenta que o país deve aproveitar “muito melhor” o Portugal 2030 e executar o PRR sem perder verbas, uma vez que “os apoios deverão baixar após 2026”.

Óscar Afonso conclui que “o crescimento recente da economia portuguesa acima da UE trouxe, afinal, pouca convergência de nível de vida: de 77,3% em 2019 para 79,2% em 2024, em vez do valor oficial de 81,6%”, a refletir uma economia de baixo valor acrescentado e pouco diversificada, demasiado dependente do turismo. Exprime ainda preocupação com o contexto externo muito adverso, no qual a guerra tarifária, a necessidade de elevar a despesa com Defesa e a redução esperada dos apoios da UE aumentam os desafios que se colocam a Portugal.

“É possível transformar esses desafios em oportunidades e aumentar a competitividade da economia, colocando-a a crescer mais de forma sustentada: tal pressupõe reformas decisivas e uma imigração regulada pela economia e capacidade de absorção social, ‘sem portas escancaradas’, mas também ‘sem muros’”, sustenta Óscar Afonso. O diretor da FEP prevê um recuo do Governo na política de vistos de trabalho, pois “não é razoável face ao perfil atual da economia, podendo até fomentar as redes de imigração ilegal, a combater com mais fiscalização”.

Enquanto complemento à “via verde”, Óscar Afonso defende “uma política de vistos de trabalho flexível e articulada com as entidades representativas das empresas, que melhor conhecerão as necessidades de profissionais nos diferentes setores”. Para ele, “esses vistos devem antes focar-se em trabalhadores especializados, com experiência e formação nas respetivas profissões, requerendo mais ou menos habilitações académicas”. O diretor da FEP propõe que se aproveite a regularização em curso de estrangeiros para, em articulação com a Segurança Social, combater situações de informalidade dos que ficarem em Portugal, de modo a reduzir a economia paralela e elevar o PIB oficial. Universidade do Porto - Portugal


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