Pintura Arq. Eduardo Moreira Santos, Lx (28.08.1904 - 23.04.1992)

sábado, 22 de junho de 2013

Tão próximos

“O Erasmus em Lisboa veio reforçar mais ainda a minha visão internacional do galego. Estar cá permitiu-me aceder mais profundamente à cultura, à história e à língua portuguesas. E é desse novo conhecimento que possuo, das minhas vivências pessoais e das minhas novas amizades portuguesas que acredito, ainda mais (se isso for mesmo possível!) na internacionalidade do galego. Para além de aspectos linguísticos, o facto de estar a estudar Estudos Portugueses / Lusófonos em Lisboa, ofereceu-me a possibilidade de aceder, sobretudo, à história e à cultura portuguesas. Se linguisticamente, os galegos e os portugueses não somos tão diferentes como a gente nos quer fazer ver, culturalmente e historicamente também não! Compartilhamos uma história comum e culturalmente, os portugueses são como os galegos. Eles têm “chacota”, que seria, em termos culturais, a nossa “retranca”, igual de pungente do que a nossa; eles, pessoalmente, são desconfiados e fechados no princípio, no mesmo sentido do que o genérico dos galegos; os portugueses também tendem a desvalorizar a sua língua e cultura a favor do inglês e mesmo do espanhol. É muito conhecida a relação histórica entre o Reino Unido e Portugal. Em geral, e a diferença de nós, os portugueses têm um bom nível de inglês por causa da sua estreita relação com este país e também devido a disporem de muitos canais de televisão integramente em inglês e legendados em português. A maior parte dos filmes e das séries mantêm-se na sua língua de origem, que usualmente é o inglês. Por outro lado, o intercâmbio e a relação cultural com Espanha também é bastante forte aqui. Não é nada estranho ver nos quiosques de Portugal imprensa espanhola ou em espanhol. Possivelmente por isto, e também pelo facto de Portugal ser um país economicamente mais pobre, os portugueses consideraram a sua cultura e a sua língua inferiores a qualquer outra, em destaque à espanhola e à inglesa.

Os galegos não nos diferenciamos nisto mesmo. Muitos ainda consideram o galego ou o português da Galiza inferior e sem valor. Preferem aprender qualquer outra língua antes que o galego e a sua obsessão pelo inglês é tanta quanta a dos portugueses. Outra coisa que nos diferencia dos portugueses é que estes têm um espírito realmente europeu. Eles sim são europeus e não os galegos ou os espanhóis! Outro aspecto interessante é que os portugueses aceitam com boa vontade o plurilinguismo, a diversidade linguística e cultural... algo que os distingue rotundamente dos habitantes do estado espanhol. Um exemplo claro disto é que a pessoa portuguesa gosta de falar a língua do estrangeiro e muitos se esforçam para isso, sobretudo, se essa língua for o inglês ou o espanhol. Em certa maneira, acho que essa boa receptividade para a diversidade é em detrimento de si próprios; é, na realidade, uma consequência da sua autonegação, do seu sentimento de inferioridade. Ainda assim, nos últimos anos tem havido mudanças nesta atitude por causa, sobretudo, da crise económica. Os portugueses têm visto que Espanha está muito pior do que Portugal, com um Governo que leva a cabo políticas de corte muito mais agressivas do que o Governo português (embora as suas medidas de corte também o sejam). Isto fez com que eles tivessem começado a se valorizar bastante mais e a se deixarem de comparar com outros povos à sua volta.

Por estas razões e por outras muitas, considero que o povo galego e o português têm muitas mais coisas que os unem do que os separam, a começar simplesmente pelo seu caráter... praticamente idêntico. Aliás, os galegos compartilhamos com os portugueses muitas lendas, tradições, folclore, música... Por exemplo, há danças tradicionais portuguesas que são muito parecidas com as galegas; por outro lado, o espírito do fado lembra-me em muitas ocasiões ao próprio de muitos alalás galegos. Só por pôr alguns exemplos. Por que não havíamos, portanto, de ligarmo-nos linguisticamente a eles, se compartilhamos, na realidade, muita cultura? Posso contar uma anedota que me aconteceu nas minhas aulas de Literatura Portuguesa Medieval, cadeira que estudei no primeiro quadrimestre em Lisboa. Quando a minha professora soube que eu era galega, preferiu que empregasse o português da Galiza nas suas aulas. Quando os meus colegas me ouviram falar em galego, muitos, que nunca o tinham ouvido com anterioridade, ficaram realmente maravilhados e mais de um exclamou: “senhora professora, como é que posso perceber tudo o que ela disse perfeitamente?!” e a minha professora tentava explicar-lhes que, na realidade, o galego era uma variedade do português embora este facto não fosse reconhecido oficialmente.

Atendendo a esta anedota, é claro que existe um desconhecimento mútuo muito fundo entre os galegos e os portugueses por causa de um isolamento histórico e político criados propositadamente. É claro também que, para um português, um galego será à primeira vista um simples espanhol, mas quando ficam a te conhecer e lhes explicas as diferenças existentes, rapidamente o percebem e aceitam facilmente a tua consideração como galego. Porém, também é certo que existem muitos portugueses que conhecem minimamente a realidade galega e acham que os galegos não são espanhóis, aceitando, dessa maneira, as especificidades galegas. As minhas experiências com os portugueses a respeito das nacionalidades e das identidades foram muito positivas. E é que, em geral, os portugueses são muito mais receptivos do que os espanhóis.” Mar López – Galiza in “Portal Galego da Língua”

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